sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Cada um de nós no meio de tudo isto*

Olá!
O meu nome é Sofia.
Tenho 23 anos.
Tenho uma irmã, a Alice.
Tenho uma gato, aliás uma gata.
Tenho dois pais que me amam.
E tenho tuberculose.
Estou a escrever porque aqui no hospital não se faz nada; estou num quartinho com duas senhoras mais velhas.
Uma tem 57 anos e teve um acidente de carro, a outra tem 65 anos e tem Alzheimer. O marido dela vem cá todos os dias e apesar de ter 67 anos é um senhor muito simpático e inteligente, teve na guerra e viajou por quase todo o Mundo depois de sair de lá, fala três línguas diferentes e ama a dona Maria (é o nome da senhora com Alzheimer) como ninguém.
Todos os dias lhe trás uma flor (uma rosa vermelha) e lhe conta histórias lindas que ambos tiveram juntos e que ela já não se lembra, e todos dias ela lhe pergunta: Quem é o senhor? E ele deixa uma lágrima cair e todos os dias lhe responde: Um amigo.
No dia que se conheceram a dona Maria tinha um ramo de rosas vermelhas e estava tão linda que parecia que irradiava um brilho como o de um anjo, contou-me ele a sorrir.
A outra senhora passa os dias a queixar-se das dores, por  isso estou com os phones enfiados nos ouvidos e a escrever.
Tenho saudades sabes?
Saudades das noitadas com o meu pessoal, saudades tuas, saudades dos pais, saudades dos cozinhados da mãe, saudades da Miau, saudades de dançar, saudades de tocar saxofone (aqui não posso, nem tenho forças), tenho saudades de ver TV, de ir ao cinema, de ouvir as tuas parvoíces; vê lá como eu ando que até da escola tenho saudades!

Mas assim de tudo, tenho saudades de viver em vez de sobreviver…
Sorrio sempre que tenho visitas, como tu e os pais mas por dentro… Estou despedaçada.
Quando tinha os meus 13 anos (olha! A tua idade) passava o tempo a pensar a sonhar.
Ia casar, ia ter um casamento de sonho! Ia ter três filhos! Uma casa azul, mas não aquele azul-bebé vulgar, era um azul só meu.
Ia ser muito muito feliz!
Mas a doença não fazia mesmo parte dos planos, acontece.
O mais irónico é que eu passava a vida a sonhar e agora que preciso mesmo de sonhar a realidade está sempre presente.
Enfim.. Sabes, quando eu tinha a tua idade era complicado, tentava ser original mas o Mundo é feito de fotocópias e eu sofria com isso.
Mas apercebi-me que estava a ser um mesma e isso valia por muito, encontrei pessoas que gostavam de mim pelo que eu era mesmo, pela minha originalidade.
Apercebi-me que estás a passar pelo mesmo; mudas-te o estilo, os amigos, as manias, a maneira de falar, mudas-te quem és e agora és igual a essas miúdas que eu vejo ai. Não gosto disso mas tu é que sabes, gostava que tivesses partilhado mais comigo mas acho normal que tivesses preferido falar com os teus amigos ´+e natural.
Mas prontos, apenas quis partilhar algumas coisas contigo. Agora estou em fase terminal.
Os médicos deram-me uma semana de vida.
Mas olha, não fiques triste, sempre que precisares de desabafar comigo, desabafa com a mãe, aprendi tudo com ela, e olha que ela sabe bem o que diz, sabe sempre.
Como não acredito em Deus, não vou dizer que vou para um sitio melhor porque não sei para onde vou.
Mas uma coisa eu sei, eu amo-te, muito mesmo e aos pais também.
Nunca te esqueças.

Com amor para a Alice,
Sofia

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